sábado, 4 de outubro de 2008

Fisiologia da Ventilação

A aplicação da ventilação mecânica implica monitorização de determinados parâmetros de mecânica ventilatória. Estes dados servem não apenas para observar a evolução clínica e ajustar a programação do ventilador, mas também para prevenir as lesões pulmonares induzidas pelo ventilador (baro e volotrauma). Vamos descrever os parâmetros que é possível monitorizar com o Servo 900C.

Pressão de Pico

A Pressão de Pico (Pp) é a pressão máxima durante a insuflação de gases. Em modalidades volumétricas controladas (VC), a Pp depende da compliance pulmonar estática (Cs), da resistência das vias aéreas, do volume corrente (Vt), do fluxo máximo e do tipo de fluxo. No Servo 900C o tipo de fluxo correntemente usado é o fluxo constante e não é possível alterar o velocidade de fluxo. Esta é automaticamente calculada em função do Vt e do tempo inspiratório (Ti). Deste modo, para uma mesma compliance e resistência, o aumento da velocidade de fluxo resulta no aumento da Pp. Também mantendo constantes estes parâmetros, fluxos crescentes resultam em maiores Pp pois as maiores velocidades de fluxo são administradas no final da inspiração. Em modalidades pressumétricas controladas (PC), a Pp vai ser muito próxima da pressão marcada. No entanto, devido à elevada velocidade de fluxo inicial e ao fluxo decrescente, a pressão inicial pode exceder em 1 a 3 cm H2O a pressão marcada. Com ventiladores volumétricos que possibilitem fluxos decrescentes (que o Servo 900C não permite), conseguem-se menores Pp para as mesmas condições de compliance, resistência e Vt que com fluxos constantes. No Servo 900C a Pp é medida ciclo a ciclo e tem leitura analógica (onde se lê a pressão a cada momento existente no ramo inspiratório) e digital (em que é registada Pp do último ciclo).

Pressão de Planalto

A pressão de planalto (Ppl) é a pressão no final da inspiração medida durante um período de pelo menos 3 a 5 seg de fluxo zero. No Servo 900C é medida com o botão pausa inspiratória prolongada, sendo a leitura feita no visor analógico de pressão. Para correcta medição, o doente deve estar em ventilação passiva, idealmente curarizado. O valor da Ppl que o visor digital fornece não é correcta, pois o Tp habitualmente existente é inferior a 1 seg. A Ppl não é influenciada pelas resistências ao fluxo, pois o fluxo é zero, reflectindo a pressão de pico alveolar. Como medida de prevenção de barotrauma a Ppl não deve ultrapassar os 35 a 40 cm H2O. Em situações clínicas associadas a baixa compliance da parede torácica (ex. cifoescoliose) aceitam-se valores mais elevados.
Na clínica, dada a possibilidade de monitorização contínua destes parâmetros, podemos utilizá-los como indicadores práticos de diagnóstico de situações correntes em doentes ventilados. Se a Pp aumenta e a Ppl se mantém, o que está em causa é um aumento das resistências das vias aéreas (obstrução do tubo por secreções, broncospasmo, etc.). Se ambas as pressões Pp e Ppl aumentarem, o problema resulta da diminuição da compliance (pneumotorax, atelectasia, edema pulmonar, etc.). A diminuição da Pp, pode resultar da existência de uma fuga no sistema.

Hiperinsuflação Dinâmica, auto-PEEP ou PEEP intrínseco (PEEPi)

A Hiperinsuflação Dinâmica resulta da incapacidade do pulmão voltar à Capacidade Residual Funcional, antes do início da inspiração seguinte. Por isso, a pressão alveolar é superior à pressão externa durante toda a expiração, e o fluxo expiratório contínua até ao início da próxima inspiração. Auto-PEEP é a diferença da pressão alveolar e a pressão externa no final da expiração. No Servo 900C pode ser medida em doentes em respiração passiva, sem grandes esforços respiratórios, com o botão de pausa expiratória prolongada, para se obter um fluxo zero durante pelo menos 0.5 seg. A leitura é feita no manómetro analógico. O auto-PEEP aparece em diversas situações; está presente na DPCO, asma e sempre que houver obstrução das vias aéreas. Elevados Vt e/ou relações I/E invertidas tendem a criar auto-PEEP, o que tem que ser medido e monitorizado. As medidas para diminuir o auto-PEEP são diminuição do Vt, diminuição da frequência respiratória, diminuição do Ti, aumento do tempo expiratório (Te), optimização da terapêutica broncodilatadora. As consequências da Hiperinsuflação Dinâmica estão relacionadas com alterações dos volumes pulmonares e pressões alveolares: 1) faz com que o Vt cicle mais perto da Capacidade Pulmonar Total onde a compliance é menor, elevando por isso as pressões, 2) interfere com o "trigger", 3) a conjugação do 1) e 2) resultam num aumento do trabalho respiratório durante o desmame, 4) tem efeitos hemodinâmicos idênticos ao PEEP extrínseco (PEEPe).

Compliance Pulmonar Estática

A Compliance Pulmonar Estática (Cs) define-se como a variação de volume por unidade de pressão. A compliance respiratória refere-se à variação de volume dos pulmões e parede torácica resultante da variação de pressão alveolar. O cálculo da Cs é feito pela seguinte fórmula: Cs = Vte/Ppl-PEEPt, em que Vte é o volume corrente expirado e PEEPt = PEEPe+auto-PEEP. Num indivíduo normal em ventilação espontânea a Cs é de cerca de 90 mL/cmH20. Num doente sem patologia pulmonar e anestesiado, em decúbito dorsal, a Cs é normalmente de 100 mL/cmH2O. A compliance pulmonar pode variar consideralvelmente de momento a momento devido a diversos factores como grau de relaxamento muscular, posição, patologia pulmonar, etc., como também pode variar em diferentes regiões do pulmão. A principal limitação da sua avaliação é a impossibilidade de medir o contributo da parede torácica. Deste modo, uma medida isolada não tem muito valor, mas a sua monitorização, desde que as condições da parede torácica não se modifiquem, dão indicação das variações da compliance pulmonar, nomeadamente em doentes com ARDS.


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