Acidente de trânsito (colisão frontal). A vítima encontra-se sentada fora do veículo, consciente e orientada, eupneica, hemodinamicamente estável, sem alterações neurológicas. Não apresenta lesões importantes, não refere dor cervical, apenas “dor no peito”, na região esternal, “levava o cinto de segurança”. O veículo apresenta deformidade frontal com actuação do air bag. Realiza-se avaliação secundária dentro da ambulância e o ECG apresenta um Flutter Auricular.
As lesões traumáticas do coração, sejam penetrantes ou não, implicam uma alta mortalidade. No trauma torácico fechado, a lesão mais frequente é a contusão miocárdica, adquirindo uma importante clínica que é evidente no embate a alta velocidade com uso do cinto de segurança e do air bag.
A definição mais aceite para contusão miocárdica, é aquela que se define como um trauma onde o dano no coração não se produz directamente por mecanismo de lesão, mas sim pela energia transmitida através das estruturas vizinhas. Dos doentes que sofreram um traumatismo torácico não penetrante entre 8% e 16% podem apresentar contusão miocárdica, Apenas 20% tem alteração funcional cardíaca. Sendo o ventrículo direito pela sua localização mais anterior e em intima relação com a parede do tórax com o esterno, o mais comummente comprometido.
As causas mais frequentes de lesão são:
Aceleração ou desaceleração súbita do tórax
Compressão entre o esterno e a coluna vertebral
Aumento brusco da pressão intratoracica
Aumento súbito da pressão intrabdominal (mecanismo muito raro).
No trauma fechado severo, o tórax embate primeiro no volante, ou no air bag, ou no cinto de segurança, comprimindo o coração entre o esterno e a coluna. Como consequência das lesões compressivas podem ocorrer vários padrões de lesão:
Alterações na condução eléctrica, provocando o aparecimento de arritmias cardíacas
Contusão com hemorragia, equimose, e petéquias na parede miocárdica
Rotura da parede miocárdica, provocando tamponamento cardíaco
As manifestações clínicas do trauma cardíaco, podem variar desde a estabilidade hemodinamica até à presença clínica semelhante ao do EAM, com insuficiência congestiva, aneurisma ventricular, aumento das cavidades cardíacas ou arritmias.
A contusão miocárdica abraça um amplo espectro que vai desde uma lesão menor, até à franca rotura cardíaca com dano do aparelho valvular e desprendimento das placas ateromatosas das artérias coronárias.
Para avaliar as possíveis estruturas danificadas e o efeito prático, podemos observar lesões sobre:
O músculo cardíaco (miocárdio) que pode ser secundário ao trauma ou à obstrução das artérias coronárias com produção de áreas de hipocinésia ou acinésia (ECG). Existe elevação das enzimas cardíacas e podem aparecer trocas compatíveis com cardiopatia isquémica.
O tecido de condução, como consequência do movimento de aceleração/desaceleração ou por hipoperfusão do tecido especializado, manifesta-se sob a forma de arritmia que é facilmente identificada no ECG. No entanto na sua ausência não descarta lesão.
Lesão arterial devido ao movimento de aceleração/desaceleração que podem fracturar uma placa ateroesclerótica que obstrói os ramos das artérias coronárias (podem originar clínica anginosa, cardiopatia isquémica ou enfarte).
Lesão sobre as válvulas e as cordas tendinosas, sendo consequência directa do trauma. As válvulas mais lesadas são a aórtica e a mitral, e a insuficiência valvular é a consequência mais frequente.
Para diagnosticar a contusão miocárdica, o parâmetro mais importantes é o critério clínico. A sua incidência é desconhecida, considera-se a sua incidência entre 10% e 80%.
O diagnóstico da contusão miocárdica é de todo um desafio. Antes da suspeita clínica de contusão miocárdica, os exames confirmatórios mais importantes são:
A realização de ECG de 12 derivações, onde ao achados mais comuns são a elevação ou depressão do segmento ST (> 5 mm), inversão da onda T, ou anormalidades da condução.
A quantificação das enzimas séricas. Considera-se que uma cifra de CPK-MB> 15 u/l e uma relação CPK-MB/CPK> 5, são provas sensíveis para diagnosticar a contusão miocárdica.
A determinação da troponina T ou troponina I, embora às vezes os seus níveis séricos não se relacionem com a identificação e prognóstico da lesão.
Para o tratamento, o mais importante é definir que os doentes devem ser transferidos para a UCI. Os indivíduos com dor pré cordial, instabilidade hemodinamica, arritmias de difícil abordagem, doença coronária prévia e necessidade de ventilação mecânica, devem ser internados na UCI.
Os sujeitos assintomáticos requerem monitorização electrocardiografica durante 24 horas. Os factores que determinam a sobrevivência numa lesão cardíaca traumática, são entre outros: o mecanismo da lesão, a localização, a presença de lesões associadas, o compromisso das artérias coronárias, presença de tamponamento cardíaco e o tempo de transporte desde o lugar do acidente até ao centro hospitalar.
A contusão miocárdica é uma patologia frequente que em muitas ocasiões está pouco ou mal diagnosticada, por estar encoberta por outro traumatismo mais grave ou por falta de provas específicas para o seu diagnostico.
domingo, 2 de novembro de 2008
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